Os impactos no Brasil da Ásia unida
Apesar de haver quem considere que a RCEP (sigla para Parceria Econômica Regional Abrangente) não impactará muito o Brasil, é melhor “botar as barbas de molho”, porque uma união entre países que somam quase um terço da população e do PIB mundiais, e da qual fazem parte a segunda e a terceira maiores economias do mundo, coincidentemente as maiores exportadoras de manufaturados e as maiores importadoras de produtos primários, certamente impactará a economia brasileira. Ou seja, a questão não é “se”, é quando.
Direta e indiretamente, os maiores impactos da RCEP se darão pela redução das tarifas entre os países membros, o que facilitará muito o comércio entre eles. A sorte é que o “quando” talvez demore alguns anos, porque a RCEP entrará em vigor a partir de 1º janeiro próximo, e 2022 ainda será de ressaca pandêmica – e ninguém se arrisca a prever como será, porque a África tem apenas 7% de pessoas vacinadas, quando deveria ter no mínimo dez vezes essa quantidade; e a Europa e os Estados Unidos voltaram a apresentar alta dos casos confirmados e de vítimas fatais da Covid-19.
Portanto, não é exagero imaginar que somente por 2025 é que se saberá de fato como essa poderosa parceria da China, Japão, Coreia do Sul, Vietnã, Malásia, Cingapura, Tailândia, Brunei, Mianmar, Camboja, Laos, Indonésia, Filipinas, Austrália e Nova Zelândia funcionará na prática. Se o “quando” tardio pode nos dar um fôlego para se antecipar aos impactos que virão, poderá também resultar em pancada maior, caso a Índia resolva ingressar na RCEP – ficou de fora para proteger o seu mercado interno –, e com ela seus vizinhos Bangladesh e Paquistão, que têm em comum grandes populações e históricos déficits alimentares.
É possível que a China estimule os países da Ásia Central a participarem da RCEP, porque ela precisa muito consolidar a conectividade asiática e europeia, através da sua iniciativa do Cinturão e Rota (BRI). Sua trajetória no acesso à Organização Mundial do Comércio (OMC), iniciada em 2001 e efetivada em 2016, comprova a eficácia política do país nas negociações comerciais. É possível também que as desavenças históricas e as desigualdades econômicas e comerciais entre os participantes contribuam para emperrar no início. E há a União Europeia e os Estados Unidos, dois grandes concorrentes (ou seriam adversários?) torcendo para que o novo bloco se desintegre já na saída. Enfim, não faltarão dificuldades.
Evidentemente, a China é a maior beneficiária dessa aliança, que surgiu em contraponto ao TTP do governo Obama – que excluía a China, e do qual o governo Trump retirou os Estados Unidos.
Já há estimativas sobre o aumento esperado da renda global com a RCEP, e da renda de seus integrantes, com a liberalização comercial de todos os setores, exceto o agrícola. O que não se sabe é o tamanho do estrago da RCEP para países como o Brasil, hoje com menos de 2% da indústria mundial, dependente da venda de alimentos e minerais e importação de manufaturados. Talvez saibamos lidar com a Ásia econômica e comercialmente forte, o que não sabemos ainda é como lidar com a Ásia unida. De tédio não morreremos.
Os impactos no Brasil da Ásia unida