Mercado acredita que decisão pode não ser unânime entre membros do Copom
Há meses, as expectativas para as reuniões do Comitê de Política Monetária (Copom) eram mornas. Sem surpresas na decisão, que se mantinha em cortes seguidos de 0,5 ponto porcentual na Selic, o mercado buscava nas entrelinhas do comunicado entender os próximos passos do comitê. A decisão desta quarta-feira (8), no entanto, pode trazer reviravoltas. Mesmo que a última decisão tenha trazido uma expectativa de mais um corte de mesma magnitude, o cenário mudou e fez parte do mercado passar a apostar em um corte mais lento, de 0,25 ponto porcentual. Agora, as projeções se dividem entre os que esperam uma Selic a 10,25% e aqueles que projetam a taxa em 10,50% ao ano na decisão de amanhã. “Consideramos essa reunião do Copom como uma das difíceis dos últimos anos, havendo bons argumentos tanto para um corte de 50 bps quanto de 25 bps”, resume Sérgio Goldenstein, estrategista-chefe Warren Investimentos, em relatório.
O que faria o Copom mudar o plano de voo?
Mas afinal, o que mudou no cenário para justificar essa possível mudança de rota nos planos do Copom? Uma piora no cenário internacional. Nos últimos 45 dias, dados de atividade e inflação nos Estados Unidos vieram mais fortes do que o esperado. Assim, com a economia ainda aquecida e pressões sobre os preços, o mercado passou a ver o início do corte de juros nos Estados Unidos pelo Federal Reserve (Fed, o Banco Central daquele país) mais ainda à frente. A aposta majoritária é de uma redução até setembro, mas há quem fale que o corte pode ficar só para 2025. “Os dados de economia americana vieram fortes. Isso trouxe o medo de que o Fed voltasse a subir os juros. Ou seja, a gente estava na iminência de um corte de juros, e a discussão mudou para eventualmente uma alta de juros adicional, por isso houve um rebalanceamento de portfólios gigantesco do mundo todo”, comenta Flávio Serrano, economista-chefe do Banco BMG.
O primeiro impacto foi no dólar, que se fortaleceu e passou rapidamente da faixa de R$ 4,95 para quase R$ 5,30. Isso traz riscos para a inflação de insumos e de produtos importados. Desde então, entretanto, o real voltou a se apreciar. “O patamar atual de R$ 5,07, além de representar um nível que não afeta de forma relevante a função de reação, pode ser visto até com algum alívio ao se considerar a forte reprecificação da curva de juros norte-americana observada ao longo do ano, particularmente em abril. Ao precificar um pouco menos do que dois cortes, o principal risco seria um cenário em que o Fed não inicie em 2024 o processo de queda de juros, o que pode acontecer, mas não é o cenário-base”, argumenta Goldenstein. A XP, entretanto, tem uma visão diferente. “O fluxo de notícias desde a última reunião do Copom foi mais preocupante para as perspectivas de inflação, tendo em vista a taxa de câmbio mais depreciada, a elevação dos preços das commodities e indicadores do mercado de trabalho mais fortes que o esperado”, afira o relatório da XP.
O que indicam os dados sobre a economia no Brasil?
“A inflação se comportou em linha com o esperado e mostrou melhoria na margem, apesar de algumas leituras negativas na parte de inflação de serviços subjacentes”, diz Serrano, do BMG. No entanto, ele ressalta que um ponto que ainda preocupa o Banco Central é a expectativa de inflação. Segundo o mais recente relatório Focus, a projeção do mercado para o IPCA de 2024 está em 3,72%. Para 2025, a expectativa é de 3,64% – ambos, portanto, acima do centro da meta, de 3%. Por outro lado, os dados sobre a atividade continuam a surpreender para cima, indicando uma economia mais aquecida – e por isso, com mais risco altista para a inflação. “No Brasil, a demanda continua aquecida. Os indicadores do mercado de trabalho estão mais fortes do que o esperado e as condições de crédito melhoram de forma gradual e consistente”, contextualiza a XP. Ainda de acordo com a XP, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, levantou discussão acerca de onde virá a desinflação adicional necessária para levar o IPCA à meta. Sobre isso, os economistas escrevem: “É difícil encontrar a resposta avaliando os determinantes habituais da inflação: a demanda interna segue aquecida; a postura futura da política fiscal é incerta; a taxa de câmbio enfraqueceu; e os preços internacionais das commodities subiram, assim como as expectativas de inflação de médio prazo”.
Até onde vai a Selic?
Essa é outra dúvida que ganhou força nas últimas semanas. Na segunda-feira (6), o relatório Focus apontou que o mercado elevou a mediana das estimativas para a Selic no fim de 2024 para 9,63% ao ano, de 9,5% na última semana. Há um mês, o patamar era de 9%. Serrano sugere a possibilidade de o Banco Central cortar a Selic ao patamar perto de 9,5%, fazer uma pausa e voltar a reduzir o nível de juros no ano que vem, até 8,5%. “O juro real neutro é algo entre 4,5% e 5%. Com a inflação operando entre 3% e 3,5%, não parece que tem muito espaço para abaixar mais do que a 8,5%”, evidencia.
Já a Warren alterou sua expectativa de Selic para o fim deste ano de 9% para 9,75%. “Apesar de seguirmos otimistas com a trajetória do real [em função da robustez das contas externas], a taxa de câmbio no restante de 2024 deverá ficar acima do que projetávamos anteriormente”, afirma o estrategista-chefe. “Além disso, o aumento do desvio das expectativas de inflação para 2025, na direção contrária ao objetivo de reancoragem, deve se refletir numa taxa terminal mais alta de forma a reforçar o processo de convergência da inflação”. A Bradesco Asset fez a mesma revisão nesta semana, de 9% para 9,75%. “Com o início de um ciclo de relaxamento por parte do Federal Reserve, consideramos em nosso cenário-base corte adicional no início de 2025, para 9,25%”, prevê, em relatório, ante estimativa anterior para o ano que vem de 9%.
Com Redação da B3
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